Textos: João 9:1-13, 28-38; Efésios 5: 8-14; Salmo 23; I Samuel 16:1-13
O tempo da quaresma é o tempo que dedicamos para refletir nossa espiritualidade e prática à luz dos ensinos de Jesus.
Hoje ouvimos a história da escolha de um novo Rei para Israel. Lembramos que Israel era antes governada pelos Juízes. Eles “eram líderes militares carismáticos, considerados escolhidos por Deus”. Por pressão do povo que exige uma outra forma de governo que pudesse representar diante dos outros povos acabam escolhendo a monarquia, seguindo o exemplo dos povos vizinhos. Achavam que seguindo o exemplo dos povos vizinhos seriam respeitados. Saul era filho único de um rico criador de jumentas. Ele contribui para a expansão do reino, mas trouxe problemas sérios ao seu povo.Haviam insatisfações com o seu governo, por causa da má administração e de suas loucuras. O profeta é a figura que irá denunciar os problemas causados por Saul. Da boca do profeta sai a sentença contra Saul: “Porque rejeitaste a palavra do Senhor, ele te rejeitou: não és mais rei!” I Sm 15:23.
Davi diferentemente da origem de Saul era o mais novo dos oito filhos de Jessé e cuidava de serviços dos empregados. Mas foi esse quem Deus escolheu. O Reinado de Davi será lembrado pela conquistas, de tratados de paz com seus aliados, as glórias e pelo amor de seu povo. O Salmo 23 é atribuído a Davi. Esse salmo nos passa confiança em Deus diante das dificuldades da vida. Apesar de toda força de ser um Rei, o mesmo se colocava frágil diante de Deus: “Deus é meu pastor, nada me faltará”. As aparências enganam aqueles que acham que o poder, a riqueza e a glória humana são garantias de se ter respeito nessa sociedade.
Agora nos reportamos ao Evangelho de João. As aparências também enganam quando comparamos nossas escolhas com as escolhas feitas por Deus. Pensamos que Deus escolhe as pessoas prósperas, as ricas, as bonitas, as famosas, as perfeitas de corpo e alma. O cego é aquele que estava fora dos padrões da sociedade do tempo de Jesus. Por ser cego, era imperfeito e totalmente desqualificado para viver em sociedade, não podia freqüentar os ambientes religiosos, pois poderia contaminar os que estavam “sãos”. Certamente, pensava-se naqueles tempos, que sua cegueira era resultado de algum pecado que ele ou seus pais cometeu. Através da acolhida oferecida por Jesus, aquele cego de nascença restaurou sua visão. Há um debate entre os religiosos fariseus pois não se sabia na história de Israel algo sobre uma cura de algum cego de nascença. Os fariseus acharam que tudo fosse uma fraude, sem contar que a tal cura foi realizada no dia sagrado do descanso: o sábado. Apesar do testemunho dos pais que seu filho era cego de nascença, os fariseus resistiram em enxergar em Jesus o messias esperado. O ex-cego não se importava com as elucubrações dos fariseus sobre a vida de Jesus. Interessava apenas em saber que ele fora cego e que agora podia enxergar.
O contexto no qual tudo isso ocorre é na Festa das Tendas e da Dedicação. Na Festa das Tendas, o povo lembra o tempo que padeceu no deserto sem casa, sem lar, mas que não faltava esperança de dias melhores. Nessa festa, o sacerdote ia buscar na fonte de Siloé água para purificar o altar. À noite acendiam-se as tochas do muro para iluminar a cidade. Tudo isso são sinais que João trabalha no Evangelho: Jesus a água que purifica e a luz que brilha na escuridão. Sinais do nosso batismo no qual estamos ligados a Deus através de Jesus Cristo.
Quem era de fato o cego da história? O que tinha deficiência visual? Ou seriam aquelas pessoas que não queriam ver em Jesus o Messias? Esses eram incapazes de enxergar nele os sinais de Isaías 42:6-7: “Eu, Javé, te chamei para o serviço da justiça, tomei-te pela mão e te modelei, eu te pus como aliança do povo, como luz das nações, a fim de abrir os olhos dos cegos, a fim de soltar do cárcere os presos, e da prisão os que habitam nas trevas”. Eram incapazes de enxergar que sua compaixão e justiça são atos de um pastor e rei, tal como foi o Rei Davi.
Ir além das aparências é o ensino da Palavra de Deus para nós hoje. Devemos abandonar nossos preconceitos para que eles não atrapalhem nossa visão: assim como fez Samuel que só enxergava a beleza física dos filhos de Jessé ou dos fariseus que não viam em Jesus o Messias esperado. O que nos atrapalha hoje nossa visão para com a vida? O que nos atrapalha nossa visão do mundo? Para com nossas relações de amizades e familiares? Para crescer em nossa espiritualidade é preciso vontade para enxergar quando estamos mergulhados na escuridão de nossos preconceitos, nossos valores transitórios. Não devemos temer em querer enxergar. Amém.
Reverendo Arthur Cavalcante+ (Homilia transmitida via YouTube para a Paróquia da Santíssima Trindade no primeiro domingo da Quarentena em Tempos do Novo Coronavirus).